terça-feira, 4 de novembro de 2008

Crisma 2. A Unção no Antigo Testamento e a Esperança Messianica

Compreendida um pouco a realidade dos sacramentos, podemos começar a nossa reflexão acerca do Crisma, abordando o seu significado no Bíblia. Primeiro, o Antigo Testamento.

Na cultura judaica, o óleo é símbolo do Espírito do Senhor. Os primeiros reis de Israel, Saul e David, são ungidos pelo profeta Samuel com óleo (1Sm 10, 1; 16, 1-13); este rito simboliza a sua consagração pelo Espírito de Yahvé. O único Rei de Israel é Deus (1Sm 12, 12). Os reis são consagrados, isto é, estão ao serviço de Deus e do povo.

Por um lado, são os enviados de Deus junto do povo. Devem transmitir a Sua vontade, pelos mandamentos. Obedecem e conduzem o povo à obediência à Aliança. Por outro lado, são os sumo-sacerdotes, os mediadores do povo junto de Deus. Presidem ao culto e apresentam a Deus as preces do povo.

É com David, cerca de 1000 anos a. C., que nasce a chamada esperança messiânica, que iria acompanhar toda a história do povo bíblico. Quando David conquista Jerusalém, habita num palácio. Mas repara que a Arca com as tábuas dos mandamentos do Monte Sinai está abrigada numa tenda. Decide então construir um templo para Deus. Mas é Deus quem faz uma promessa a David, pelo profeta Natan:

«E quando esgotares os teus dias e repousares com os teus antepassados, Eu exaltarei a tua descendência depois de ti, aquele que vai sair de ti. E firmarei a tua realeza. Ele é que vai construir uma casa para o meu nome. E Eu estabelecerei o seu trono real para sempre. Serei para ele um pai e ele será para Mim um filho. Se ele falhar, Eu corrigi-lo-ei com bastão e chicote, como se costuma fazer. Mas não desistirei de ser fiel para com ele, como desisti de Saul, que tirei da tua frente. A sua dinastia e realeza permanecerão firmes para sempre diante de Mim; o seu trono será sólido para sempre» [2Sm 7, 11-16].

De David sairá um filho que construirá um templo para o Senhor, e o seu reinado durará para sempre. Será um filho para Deus. O filho de David, Salomão, depois de entronizado, construiu um templo para Deus em Jerusalém. A primeira parte da promessa está realizada (1Rs 8, 20). Falta a segunda.

Mas quando morre Salomão, o reino divide-se. As tribos separam-se da tribo de Judá (a tribo de David), e formam o reino de Israel, ao norte. A promessa parece quebrada. Afinal, Salomão não era o filho prometido por Deus. O povo deveria esperar outro Ungido (que em hebraico se diz Messias), na certeza da fidelidade de Deus. Seria esse Ungido com o Espírito do Senhor que reunificaria as tribos de Israel.

No séc. VIII a. C., os reinos coligados da Síria e de Israel ameaçam Judá. O seu rei, Acaz, apela à protecção e presta obediência ao rei de uma potência pagã, a Assíria (2Rs 16, 7). O profeta Isaías apela ao rei para que procure a protecção apenas junto de Deus, e apresenta um sinal de Deus: a mulher de Acaz está grávida, e o seu filho chamar-se-á Emanuel, que significa “Deus connosco” (Is 7, 14). Os profetas não são adivinhos, apenas têm uma fé inabalável em Deus e sabem ler os sinais à sua volta com esperança. A descendência davídica está assegurada. Além disso, sairá “um rebento do tronco de Jessé”, pai de David, sobre quem “repousará o Espírito do Senhor” (Is 11, 1-2). Da descendência de David sairá um Ungido.

Mas o certo é que os sucessivos reis de Judá, descendentes de David, não apareciam aos olhos do povo como Ungidos... No séc. VI a. C., é Judá quem cai, agora perante a Babilónia. O povo é deportado. Os profetas Miqueias, Jeremias e Ezequiel apresentam o exílio como castigo de Deus perante a infidelidade do povo à Aliança. Mas anunciam também o Salvador. De Belém (cidade natal de David) sairá “aquele que governará Israel” (Mq 5, 1-4); de David sairá um rebento que “será rei, governará com justiça” (Jer 23, 5-6); Deus será o pastor do povo, por Seu servo David (Ez 34, 1-10.23-31).

Depois da Babilónia, o povo regressa do exílio, mas continuará governado por potências estrangeiras. Desde a Pérsia até à Grécia de Alexandre Magno, os profetas continuarão a anunciar o Messias, a um povo sem rei davídico. Zacarias anuncia um rei de paz (Zac 9, 9-10).

O Messias começará também a ser esperado como aquele que executaria a justiça de Deus, castigando os opressores (as potências estrangeiras) e libertando os oprimidos (o povo judeu). Surge uma literatura apocalíptica, como o livro de Daniel. Este apresenta o Filho do Homem, imagem do Messias, a quem é dada “a soberania, a glória e a realeza” (Dn 7, 13-14). Será esta a noção de Messias que começará a predominar num povo sempre oprimido, chegando até João Baptista, “o maior dos nascidos de mulher até ao Reino de Deus” (Lc 7, 28). João prega um baptismo de conversão, pois “o machado já se encontra à raiz das árvores; por isso, toda a árvore que não der bom fruto será cortada e lançada ao fogo.” (Lc 3, 9). É o dia de Yahvé, o dia da ira e da justiça do Senhor, que seria inaugurado pelo Messias.

Será uma esperança que acompanhará e marcará toda a história do povo judeu. A chegada do Ungido, ou Messias, que restabeleceria o reino davídico.
um grande abraço!

Sem comentários: