sexta-feira, 7 de junho de 2013

07.06

[Lucas 15]

«Um sai de casa, outro recusa entrar. Um passou fome, o outro não quer comer. Um rompe com o pai, o outro nunca foi filho no seu coração. Agora, nem o irmão é irmão (Lc 15, 29-30). Que faz o pai? O pai vai ao encontro de um e de outro. O pai é inalterável. Nada o pode impedir que ame, que faça viver e ressuscite os seus filhos. "Mas tudo o que é meu é teu." Ambos ressuscitam a partir do amor do pai, que não vacilou nunca. "O meu filho estava morto e agora vive". É do acesso à vida que se trata. Ser filho é poder entrar plenamente no dom da vida do pai. 

Os fariseus dizem ser filhos de Abraão e herdeiros da promessa, mas a sua atitude mostra o contrário: são conservadores da herança. São os censores da transgressão da lei. Julgam saber e ser os únicos a saber e por isso exprimem-se segundo o modo do murmúrio (certeza não interpretável). Parece que para ser filho é preciso usar a herança, mesmo ao risco de a esgotar ou perder e, a partir daí, dar sentido a esta perda. O estado de pecador reconhecido permite ao mais novo perceber que o dom do pai é permanente e sempre renovado. Este estado de não saber é aquele em que nos introduz a parábola.

Porque é que Jesus conta esta parábola? Para responder a quem julga pecaminoso o seu comportamento com os pecadores. Os escribas e fariseus podem dizer de Jesus: tu és como esse vagabundo, um filho pródigo. O leitor sabe que este é o caminho de Deus. Aos olhos da Lei Jesus é como o filho errante, perdido. Aos olhos de Deus é o Filho amado, obediente, que nos faz conhecer o coração de Deus.

É este traço que encanta Lucas. Já no Baptismo o vê assim: descer às mesmas águas que os pecadores. Estes notáveis não conhecem Deus, mesmo se se gabam de lhe obedecer em tudo, e é nisso que se parecem com o filho mais velho que desconhece o pai que tem, apesar de viver com ele toda a vida. Eles puseram a Lei no lugar do Pai: nenhum espaço para o amor, a gratuidade, a liberdade. Murmurais contra o banquete, em cólera, desprezais o mais novo que identifica com os pecadores.

Jesus não é o filho mais novo, mas o Primogénito. Ser Filho é para Jesus fazer o contrário do que faz o mais velho, na parábola, para quem o pai é o patrão. Jesus conhece o Pai. Por isso é fraternal. Se nos afastamos para os caminhos da perdição ele virá buscar-nos. É o que faz a Zaqueu. Jesus vai afastar-se, sim. O filho mais novo anunciava a Páscoa. O calvário vai ficar no cruzamento de todos os caminhos de perdição, de morte. Jesus será colocado ao lado dos sem fé nem lei (22,37). Eu sou um só com os perdidos. Há um eco de Páscoa no grito de festa do Pai. "O meu filho estava morto e agora vive" (25,5.23). Ele é o pastor das ovelhas perdidas. No Calvário ele é um e outro destes filhos da parábola. O que mostra que estes exemplos foram escritos à luz da Páscoa.

É para lá que vamos, passando este deserto ou este calvário. Nós somos simultaneamente o filho mais novo e o filho mais velho. Só Deus é inalterável. Só o amor resiste à impaciência e à morte.»

José A. Mourão, «Quem Vigia o Vento não Semeia», Lisboa 2011

2 comentários:

Anónimo disse...

Olá Rui,
Sabes sou mesmo distraída, acredita.
Já conheço o teu blog à uns tempos mas só hoje reparei no autor do mesmo.
Parabéns pelo teu trabalho.. continua assim ao jeito do Mestre.

Abraço e um beijinho como pedido de desculpa pela minha cabeça no ar.
Shalom

Rui Vasconcelos disse...

Olá Carla!

Eu também é raro passar por aqui agora, a Fundamentos ocupa-me o tempo todo!

Um abraço, tudo de bom!
Rui Pedro