sexta-feira, 31 de outubro de 2008

O Testemunho biblico sobre o Homem

Viva! Nas últimas sextas, hoje e na semana passada, tivemos aqui no Seminário em Gaia dois encontros abertos de formação. O tema foi o Homem segundo a história biblica. Partilho o texto que utilizamos hoje - é uma tentativa de síntese desta história biblica, desde o Génesis até Jesus e o Novo Testamento. Bom fim-de-semana!


Génesis: Adam, Imagem de Deus

Percorrer a história biblica é percorrer o testemunho de uma história que Deus faz com a Humanidade, que Deus faz connosco. Uma história que tem a ver precisamente com o ser humano, com o Homem no centro: estamos profundamente enganados quando atiramos a história bíblica apenas para o campo religioso; ela testemunha acima de tudo uma história do ser humano à luz da relação com Deus.

Os textos sobre a Criação do livro do Génesis (Génesis é uma palavra grega que significa Origem, Génese) proclamam sobretudo a grande dignidade do ser humano como eleito, amado e escolhido por Deus para uma história de Aliança. São textos que partem da experiencia de Fé de um Povo, Israel, e por isso não estão preocupados em dar uma resposta cientifica à questão de como começou o mundo. São textos de Fé, com um sabor mais poético do que propriamente cientifico, o que não significa que sejam menos verdadeiros! Não falam sobre o começo do Cosmos nem sobre os primeiros homens à face da terra, mas falam do sentido do Universo e da Humanidade como um Projecto, hoje também.

Assim, são muito bonitas as imagens e símbolos que o livro do Génesis utiliza para falar de nós, de nós próprios, do ser humano (Adam, em hebraico) à luz da sua experiencia de Fé em Deus:

A Criação em 7 dias: não se trata do tempo cronológico; o sete, na Biblia, é um símbolo de plenitude e o 7º dia, o Sábado, é símbolo, em Israel, da Aliança com Deus. Assim, o texto proclama que a Criação é um Projecto de Aliança, um Projecto com Sentido, uma história que está a acontecer onde tudo existe em função do ser humano: Deus prepara um contexto para que Adam possa viver, toda a Criação está em função do Homem.

O Ser Humano é Imagem de Deus: Israel como Povo faz a experiencia de que Deus o escolhe como parceiro de Aliança, para construírem uma história juntos. A partir dessa experiencia, o Génesis proclama que o Homem é um ser único e privilegiado em toda a Criação, porque Deus o elege para ser seu Parceiro de Aliança, para que o Homem domine sobre toda a Criação e seja Criador de si próprio, da sua história. Uma relação especial com Deus, única, que lhe dá uma dignidade de imagem que ninguém pode retirar – é esse também o símbolo do Beijo: Adam nasce do pó (a Adamah, o Húmus fértil da Criação) para ser beijado por Deus, para receber o seu hálito de Vida.

Adam não pode estar só; por isso recebe uma Auxiliar, Eva: é em relação, em Aliança que o ser humano se realiza; sozinho, separado, torna-se apenas metade de si próprio. O Homem vive enquanto convive, enquanto se constrói em relações de pertença, de Aliança, de Comunhão. Só é de verdade Pessoa na medida em que comunica, se partilha e recebe.

Por fim temos toda a catequese do Fruto da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, que Adam e Eva comem. Fundamentalmente, o que o Génesis proclama é que Deus respeita o Homem como numa Aliança com duas partes: assim o Homem pode recusar, como recusa, o Projecto de Deus para a Criação, inserindo na Criação ritmos de pecado, ritmos contrários ao Amor que rompem e bloqueiam as relações. A “expulsão do Paraíso” significa precisamente que a Criação não é ainda o contexto de plena emergência do ser humano, e que Deus inicia com o Homem um caminho de libertação e de transformação pessoal!

Jesus de Nazaré: o Sonho de uma Nova Humanidade

Jesus de Nazaré foi um Homem acima de tudo apaixonado por Deus, não um deus ausente e longínquo lá nas nuvens, mas o Deus Vivo e Presente, que está Próximo da história do seu Povo e com ele vive uma Aliança. A grande novidade da vida e do anúncio de Jesus foi o Reino de Deus: o Deus da Graça faz-se presente na nossa história, não para a condenar ou julgar, mas para a salvar, para a recriar e libertar com o seu Amor. O Reino de Deus, para Jesus, é a proclamação do Perdão e do Amor de um Deus que se faz Próximo de todos os homens!

Esse tal Reino de Deus significa, para Jesus, o nascimento de uma Nova Humanidade: não uma Humanidade perfeita, acabada, mas a que somos, a única que existe, esta Humanidade formada por todos os homens e mulheres em construção na sua vida. A presença do Amor Salvador de Deus significa, para Jesus, o nascimento de uma Nova Ordem, de uma Nova Era de relações marcadas, não já pela violência, mas pela Fraternidade, pelo Perdão e pela Graça – a experiencia do Amor de Deus, o Amor de um Pai, conduz-nos a viver como irmãos! É uma Humanidade onde já não há lugar para pessoas que não são reconhecidas como Imagem de Deus. É uma Humanidade onde o maior é aquele que serve, onde o Amor supera todas as lógicas de grupo social ou religioso. Uma Humanidade segundo a vontade de Deus.

Jesus não é um teórico ou um sonhador nas nuvens; essa Humanidade que sonha, vive-a em gestos e palavras concretas, que provocam reacções no seu tempo: para Jesus, o ser humano está no centro, relativizando todas as normas e costumes religiosos e sociais. Jesus inicia com os seus irmãos um Projecto de Libertação, de Humanização, onde todas as dimensões da nossa vida sejam marcadas cada vez mais pelo Amor. Claro que um Projecto destes, tudo menos teórico, provoca resistências nos poderes instituídos, sobretudo quando Jesus o vive afirmando que é vontade de Deus. A Cruz revela bem que nem Jesus foi um teórico, nem o Reino de Deus, a Nova Humanidade são uma teoria, mas continuam a encontrar resistências de morte.

Novo Testamento: a Plenitude dos Tempos para a Humanidade

Tudo teria terminado ali, há dois mil anos, se não tivesse acontecido algo de extraordinário: a Experiencia Pascal. Os discípulos de Jesus proclamam que aquele homem, morto e crucificado nas mãos das autoridades judaicas e romanas, foi Ressuscitado por Deus. A sua Vida é agora universal e plena, é assumida na própria Vida de Deus.

Então, no anúncio dos discípulos e das primeiras comunidades cristãs, algo de muito bom, de radicalmente novo acontece, e que tem a ver com todos os homens e mulheres: um Homem, Jesus de Nazaré, um dos nossos, da nossa Humanidade, ressuscitou e, logo, todos Ressuscitamos nele! O Projecto que ele anunciou, o Reino de Deus, a Nova Humanidade, afinal não são uma teoria: estão plena e definitivamente inaugurados, chegou a Plenitude dos Tempos! A Humanidade sonhada pelo Génesis, em plena comunhão com Deus e com os irmãos, está inaugurada, é já um Projecto de Sucesso! A verdadeira dignidade do Homem, do ser Humano, é revelada como Graça de Deus: somos Filhos de Deus, à imagem de Jesus de Nazaré!

A espinha dorsal da história bíblica é a história que Deus faz com a Humanidade, história testemunhada primeiro por Israel (Antigo Testamento) e depois pelos discípulos de Jesus (o Novo Testamento). A história de um Projecto, de um Sentido para a Humanidade que, à luz da Ressurreição de Jesus, é já uma Humanidade salva, com um horizonte de Plenitude. Uma Nova Humanidade que não vem de cima nem de fora, mas que continua a nascer, animada pelo Espírito Santo, no seio da nossa história e das nossas relações como apelo ao perdão, à Justiça, à Verdade, ao Homem Novo, o Adam de Deus, cada um de nós


Tenho uma Palavra a dizer-te,
Uma Palavra a sussurrar-te…
Uma Palavra sobre ti, uma Palavra que és tu,
Uma Palavra que quer entrar nos teus dias
Como novidade no meio das tuas tantas rotinas…

Podes ter a certeza de que não quero entrar na tua vida
Para te oprimir, te substituir
ou para te tirar a alegria de viveres…
Escuta-me como uma Palavra de Vida, de Liberdade,
De Alegria, de Salvação, de Bondade para a tua vida,
A tua vida que vais construindo, dia a dia,
Opção após opção, com aqueles a quem mais amas.

E descobre-te unido, proponho-te,
Descobre-te unido a uma Família Universal de irmãos,
Uma Família chamada Humanidade,
A quem pertences, a quem estás a edificar.

Uma Família que viu nascer um Homem, um dia,
Chamado Jesus, Jesus de Nazaré,
Um Homem por quem te chamo, hoje, num sonho,
Meu Filho muito amado.

4 comentários:

Anónimo disse...

obrigado por este post. ofereces-nos um trabalho excelente .
É verdadeiramente um testemunho de fé e maturidade cristã.
Estou convencido de que muitas pessoas vão ficar mais ricas graças a este teu crescimento espiritual.
Um abraço
Calmeiro Matiaas

Sol da manhã disse...

... de facto, somos uns grandes privilegiados!

Muito Obrigada.

Um grande abraço.

SHALOM

Anónimo disse...

Olá Rui...
Este post veio mesmo na «hora certa».Sabes eu sou catequista, e no próximo sábado sou eu a orientar a catequese, este teu post veio-me me dar mais umas «luzes» sobre aquilo de que vou falar «Criados à sua imagem e semelhança».Esforço-me sempre para que as crianças não fiquem com uma ideia errada, acerca do projecto de Deus para nós.
Mais uma vez Obrigagda!
Beijinhos grandes desta Amiga!

Anónimo disse...

Que grande equipa vocês fazem!Acabamos de ler, com os olhos e oo corações encantados, o resumo das duas sessões!
Que grande graça é a consciência de pertença à grande família que é esta Humanidade em construção, a caminho da plenitude...
Povo de Deus que caminha, sempre como Povo, "Família Universal de Irmãos". É verdade que às vezes caminhamos às apalpadelas, sempre que perdemos de vista que, o perdão, a verdade e a justiça são a "marca de água" na fronte do Homem Novo! Um abraço agradecido aos dois. Glória e C. Figueiredo