sexta-feira, 26 de junho de 2009

A Maior é a Caridade

«A Caridade, o amor de que aqui se trata, não é, em primeiro lugar, uma virtude adquirida ou a adquirir por nós. A realidade mais alta, preciosa e poderosa que nos leva a conseguir a competência da liberdade e da consciência, é o Amor que Deus nos ofereceu, sem o merecermos.

O Amor não se compra. Ele entra e habita de boa-vontade em nós se, agradecidos, o recebermos como um dom. O amor mais excelente não é aquele com que começamos a amar, mas o amor bate à nossa porta e que quer entrar e habitar no nosso coração. Da mensagem central da Bíblia fazem parte estas palavras: «Nós amámo-lo, porque Ele nos amou primeiro» (1Jo 4,19). «Deus, porém, demonstra o seu Amor para connosco… quando ainda éramos pecadores» (Rom 5,8).

Mas este hóspede que quer entrar dentro de nós merece e exige atenção e gratidão. S. Paulo exorta-nos, na primeira carta aos Corintios (capítulo 13), a abrirmo-nos a este dom e a cultivá-lo com esmero. Não podemos cultivá-lo como se de uma de tantas outras coisas se tratasse. Ele quer ser reconhecido e apreciado como se fosse a coisa mais preciosa. «Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade sou como um bronze que ressoa, ou como um tímpano que tine» (13,1). Mesmo que conheça tudo e tudo possa, será ainda verdade que «se não tiver caridade nada sou» (13,2).

E é precisamente neste contexto que Paulo se esforça por mostrar-nos o verdadeiro rosto e a verdadeira identidade deste Amor. Seguindo de perto as suas pegadas tentarei ilustrar os traços característicos do Amor redimido e redentor. Por outras palavras, procurarei definir a competência da liberdade redimida.

O Amor é o núcleo e o olho da Fé;
o Amor irradia confiança e esperança;
o Amor é a fonte da verdadeira justiça;
do Amor nasce a prudência, que é o seu olho atento;
o Amor redimido é garantia da força do espírito, a verdadeira fortaleza;
o Amor sem limites ensina a temperança;

o Amor que provém de Deus é misericordioso e cheio de compaixão;
quem se fia neste Amor irradia paz e alegria;
o Amor faz-nos preserverantes no serviço do Amor;
o Amor opera a kénosis, o afastamento de tudo o que se opõe ao Amor;
ele faz da perda um ganho; é criativamente fiel;
irrompe em gratidão e torna-nos serviçais;
está atento para receber o dom de cada momento;
dele jorra o dom do discernimento do espírito;
só ele nos faz perseverantes no serviço de Deus;

admira-se do crédito do amor divino que Deus
nos concedeu e nos continua a conceder;
alimenta o espírito de penitência e aprofunda constantemente a conversão;
opera uma síntese frutuosa entre a santa paciência e a inquietação;
liberta da dúvida sem sentido e torna fecunda a própria dúvida;

irradia alegria que é, no bom sentido, contagiante;
suscita e alimenta o humor, o suave sorriso do amor;
vive do entusiasmo e transmite-o ao mesmo tempo;
é generoso porque sabe que ele próprio é um dom;
manifesta-se com parcimónia atraente;

faz a síntese entre a brandura saudável (epikéia) e o zelo pela lei;
é fonte de uma verdadeira capacidade de diálogo;
combate o mal moral e o fanatismo intolerante;
faz-nos discípulos não-violentos de Jesus;

é magnânimo sob todos os aspectos;
alimenta a nobreza de espírito e toda a espécie de generosidade;
a sua força manifesta-se na serenidade e mansidão;
desmascara, com a sua franqueza, o aviltamento e a falsidade;
é fonte de obediência responsável;

é, sob todos os aspectos, veraz e transparente;
ensina-nos a caminhar de cabeça erguida, pela virtude e pela rectidão;
está aberto a tudo o que provém do Amor e ao Amor conduz;
é absolutamente casto e desmascara toda a impudicícia;
torna-nos ricos e sóbrios em todos os sentidos;
ensina-nos a envelhecer com dignidade
e a arte decisiva de bem morrer (ars moriendi).

O Amor vence na vida e vence na morte. »

Bernhard Haring cssr. Bom fim-de-semana!


1 comentário:

figlo disse...

Rui Pedro, muitas vezes ouvi falar de Bernhard Haring e ia gostando sempre do que me diziam dele, da sua força, da sua clarividência perante a vida, os acontecimentos. Mas quando, há pouco tempo li "esta Igreja que eu amo" fiquei verdadeiramente de queixo caído...e mais ainda quando vi a identificá-o a sigla cssr. Só podia ser! Glória